Muita gente atribui a origem do Rugby, no ano de 1823, a um fato ocorrido durante um jogo de futebol numa escola na cidade de Rugby, na Inglaterra, quando um jovem chamado William Webb Ellis pegou a bola e correu em direção à linha de gol do adversário.

Há também a teoria de que o esporte se originou há mais de dois mil anos, na época do Império Romano, quando eles praticavam um jogo de bola chamado “Harpastum”, palavra latinizada do grego ἁρπαστόν (harpaston), do verbo ἁρπάζω (harpazo), que significa “apreender, arrebatar”, o que sugere que alguém carregava ou segurava a bola durante a partida.

O fato é que, independentemente de qual seja a origem real do Rugby, ele se tornou um dos esportes mais populares do mundo, com milhões de pessoas que jogam, assistem ou tem algum contato com o esporte.

Rugby no Brasil e na Austrália

No Brasil o esporte tem se tornado mais popular com o passar dos anos, mas ainda está longe de ser jogado por crianças nas escolas de ensino regular como na Austrália, onde no estado de Queensland, por exemplo, tanto escolas públicas quanto privadas oferecem aulas de Rugby para os estudantes. 

O primeiro clube de Rugby formado na Austrália foi na Universidade de Sydney em 1864, com os membros jogando entre si ou contra tripulações de navios britânicos que passavam pela cidade. O clube aderiu às suas próprias regras, que se baseavam no que eles acreditavam ser a prática na Inglaterra naquela época, pouco depois do episódio protagonizado por William Webb Ellis.

Neste post, contamos a história de brasileiros apaixonados pelo Rugby, que começaram a praticar o esporte no Brasil, e depois que vieram para a Austrália, mantiveram a relação com o Rugby.

A Tagarela tem orgulho de apoiar a Brasil Rugby League há cinco anos, e de ter auxiliado no processo de visto de praticantes do esporte que vieram para a terra dos cangurus fazer intercâmbio. 

Amor à primeira partida

Byanca Santa Rita, natural de Cuiabá, Mato Grosso, que hoje mora em Sunshine Coast, Queensland, conta que conheceu o Rugby com a prima dela, que praticava o esporte. “Ela conheceu o Rugby na faculdade e me convenceu a ir também. No começo eu tive um pouco de receio, mas depois do primeiro tackle (jogada de defesa do Rugby, quando um jogador defensor derruba o portador da bola), não teve mais volta.” Byanca, que tinha 16 anos na época, nunca mais parou de jogar.

Ela explica que o que mais a atraiu no Rugby foram os valores. “Por ser um esporte de contato, as pessoas precisam sempre performar sua versão mais educada. Outro fator muito atrativo é a união que um time cria dentro e fora de campo. Você cria conexões para a vida toda”. 

Rodrigo Rezende, ex-jogador de Rugby que está há sete anos em Sydney, conta que teve seu primeiro contato com o esporte entre 2010 e 2011, quando estava na faculdade. “Eu jogava futebol americano desde os 17 anos de idade na minha cidade natal, Ipatinga-MG. Nenhum dos dois esportes era popular, mas era a época de ouro do YouTube, e a ESPN passava alguns jogos das duas modalidades”. 

Ele conta que o que o atraiu no esporte foi que o Rugby Union (XV) era uma alternativa mais simples e barata para ele do que o futebol americano. “No interior de Minas Gerais, o acesso a equipamentos e até a prospectos era muito limitado. Com os estudos sobre o Rugby e os treinos, também percebi que era muito mais fácil de aprender e de treinar do que o futebol americano”. 

Levando o esporte a sério

Em 2012 Rodrigo deixou o clube de Futebol Americano de Ipatinga e fundou o primeiro clube de Rugby Union da cidade: o Ipatinga Rugby Clube. Ele também fundou, no mesmo período, o primeiro clube de Rugby feminino da região. “Eu já trabalhava, porém ainda estava na faculdade e morava com os pais. Eu tinha uns 20 anos, muitos sonhos, e pouco dinheiro”, brinca.

Ele explica que o que era um hobby, rapidamente se tornou algo mais sério. “Sem entrar em competição, nunca conseguiríamos jogar. Na época, o circuito mineiro de Rugby Union era bem interessante. Havia duas divisões e vinte times no estado. No nosso segundo ano de clube, em 2013, o Ipatinga Rugby compôs a segunda divisão e venceu invicto a competição, chegando a ganhar acesso para a primeira divisão no mesmo ano. A gente jogava Rugby Union todo fim de semana, quase que o ano inteiro, com outros times ou fazendo um racha interno”. 

Rodrigo, segurando a bola, durante jogo de Rugby em Sydney.

Byanca conta que conheceu o Rugby em um clube social, então no começo eram apenas dois treinos na semana e alguns campeonatos esporádicos por ano. “Por volta de 2016/2017 comecei a dedicar mais tempo aos treinos e a me envolver em projetos de desenvolvimento do esporte na minha cidade. Mas só em 2018 recebi um convite para de fato ser profissional e participar do grupo de alta performance do Brasil na modalidade de Rugby Sevens”. 

Ela explica que durante a pandemia da COVID-19, decidiu voltar para a cidade natal, o que a fez regressar ao seu clube de origem, que estava em um processo de profissionalização das atletas.

“O Rugby League eu conheci em 2021, quando começaram as movimentações da confederação, de recrutamento de atletas para a Copa do Mundo. A equipe profissional em que eu estava na época sempre encorajou as duas modalidades do Rugby (League e Union), então foi uma ótima oportunidade de aprender sobre a League e me apaixonar pela modalidade”. 

Rugby no Brasil

Ao falar da Brasil Rugby League (BRL), Confederação Brasileira de Rugby League, fundada em 2018, que tem a Tagarela como uma das patrocinadoras há cinco anos, Byanca diz: “É muito importante, por dar visibilidade para o Rugby League sul-americano, porque muitas pessoas não conhecem a modalidade ou tem até um certo preconceito com o esporte. Uma confederação que consiga trabalhar no desenvolvimento de novos atletas e de implementar um bom projeto de base é imprescindível.”

Sobre o nível do Brasil no Rugby, Byanca fala: “Estamos bem longe de países que possuem o Rugby League inserido em sua cultura, e que recebem investimentos direcionados à modalidade, como é o caso da Austrália. No Brasil temos muita dificuldade de recrutar jogadores para a modalidade (que é considerada muito nova se comparada com as outras modalidades de Rugby no país), e uma dificuldade ainda maior de conseguir infraestrutura para a prática da modalidade”. 

Rodrigo, primeiro em pé à direita, com seus colegas brasileiros de time de Rugby na Austrália.

Rodrigo explica sobre Rugby League: “É importante dizer que existem dois códigos de Rugby: Union, com 15 jogadores, e League, com 13. As duas modalidades têm muitas semelhanças, incluindo a bola oval e o passe para trás. A BRL difunde no Brasil o Rugby League que, na minha opinião, se trata de uma ferramenta maravilhosa de inclusão e entretenimento, por ser muito mais simples de ensinar, treinar e jogar do que o Rugby Union. Eu tenho ampla experiência com os dois esportes, inclusive joguei nas duas modalidades aqui na Austrália”. 

Ele destaca a evolução dos times femininos no Brasil: “Tanto no Union quanto no League, os times femininos no Brasil parecem ser muito melhores que os masculinos. O nível nas duas modalidades tem aumentado consistentemente, desde que eu me envolvi com o Rugby em 2012. Mas ainda há um longo caminho pela frente. Eu não acredito que o Rugby algum dia vá chegar perto do futebol, mas poderia sim ser uma segunda opção viável para jovens atletas. Principalmente com a capacidade de participar de uma Olimpíada através do Rugby Sevens – modalidade olímpica do Rugby Union”. 

Vinda para a Austrália e a relação com o Rugby no país

Ao falar do que o motivou a vir para a Austrália, Rodrigo conta que decidiu se mudar para o país no ano de 2000, quando viu as Olimpíadas de Sydney. “Fiquei maravilhado com tudo. Nunca quis ir para a Disney, Europa, etc. Inclusive nunca fui. Acho que desde aquele momento a vida passou a ser uma preparação para a minha aventura australiana”. 

Rodrigo explica que conheceu a Nina, diretora da Tagarela Intercâmbios, em Belo Horizonte, por causa do Rugby, pois a Nina jogou no Belo Horizonte Rugby, na capital mineira, durante alguns anos, e quando o Rodrigo se mudou para BH também se juntou ao time. Nina nessa época já morava na Austrália e trabalhava com intercâmbio, e Rodrigo a conheceu por um amigo em comum que sugeriu que ele a procurasse para saber mais sobre intercâmbio na terra dos cangurus. 

“Foi um momento que mudou a minha vida e eu sabia que aquela era finalmente a hora de correr atrás do meu bumerangue. Depois de sete anos e um filho aqui, eu digo pra todo mundo que a Austrália se torna o que você fizer dela. Inicialmente a paz do dia-a-dia, o acesso a uma moeda forte que abre portas para experiências, cultura e tecnologia. Morar aqui é incrível. Mas é necessário ter a cabeça nas nuvens e os pés no chão, pois sem um planejamento sério e profissional, muita gente se perde”, afirma Rodrigo.

Rodrigo, à esquerda, em Sydney com um amigo.

Byanca diz que morar em outro país era um sonho de criança, que ficou “guardado” por anos que já estava meio esquecido, mas acabou sendo “despertado” com a participação na Copa do Mundo de Rugby League de 2022, no Reino Unido. “Recebi muitos incentivos dos profissionais envolvidos com o projeto do Brasil Rugby na Copa, o que reacendeu esse meu desejo de infância de morar e conhecer mais sobre um outro país”. 

Há pouco mais de um ano no país, Byanca mora em Sunshine Coast, no estado de Queensland, com a esposa Franciny Amaral, que também pratica o esporte e chegou a ser destaque na Copa do Mundo de Rugby. Elas se conheceram na Nova Zelândia durante um “camp” da seleção brasileira, uma espécie de acampamento para aprimorar conhecimentos táticos e técnicos das atletas, onde as brasileiras jogaram contra Fiji, Nova Zelândia, Rússia e China. 

Byanca, à esquerda, com a esposa Franciny em Sunshine Coast.

“Atualmente estou jogando o campeonato regional pelo time de Noosa, o Pirates, que foi uma equipe que recebeu os brasileiros de braços abertos. Tem sido uma ótima experiência pois é uma competição com 12 rodadas, o que é muito novo e legal para mim, pois no Brasil o número de jogos que uma atleta tem por ano é bem baixo”, explica Byanca.

Já Rodrigo passou por algumas fases relacionadas ao Rugby na Austrália. Ele conta que veio para o país com a ideia de praticar Rugby Union. Joguei em um time de Sydney e depois foi convidado a compor a seleção de brasileiros na Austrália (os Braussies). “Tive a honra de ser o primeiro capitão da equipe em jogos contra Uruguai, Peru, El Salvador. Foi incrível! Também joguei uma temporada de Rugby League. Aí veio o Covid, eu rachei o quadril e me aposentei. Hoje eu sou o velho manco do bar que curte assistir qualquer jogo que estiver na TV”, brinca Rodrigo, que se dedica ao Jiu Jitsu e não descarta voltar a jogar Rugby.

Conviver com a popularidade do Rugby

Rodrigo diz que acha bem interessante estar em um país em que o Rugby é mais popular. “O Rugby (qualquer modalidade) é maravilhoso para jovens, de ambos os sexos, como ferramenta de inclusão e desenvolvimento de habilidades sociais, além de te deixar numa forma física invejável. E também é muito divertido de assistir. Eu sou suspeito de falar, mas me amarro nos jogos”. 

Byanca também vê vários pontos positivos em conviver com a popularidade do Rugby na Austrália: “É incrível, pois pela primeira vez pude experimentar como é conseguir falar do meu esporte preferido com absolutamente todas as pessoas, em todos os meus ambientes de convívio, e o maior benefício é poder assistir um Rugby de alta qualidade e frequentar estádios em dias rotineiros”. 

Ela explica os benefícios da prática do esporte por pessoas das mais variadas idades, incluindo crianças, e rebate a crença de algumas pessoas de que o Rugby é violento: “É um esporte de contato e por isso muitas vezes as pessoas acabam por confundir com violento. Mas o Rugby é um esporte de muitos valores e princípios, onde o respeito tem a mais elevada estima. Então acredito que é uma ótima opção para ajudar as crianças a regularem as próprias emoções e a construir autoconfiança. Sem falar que é excelente para fazer novas amizades”. 

Byanca e a esposa Franciny vestindo o uniforme do time de Rugby do qual fazem parte em Noosa, Sunshine Coast.

Rodrigo reforça que o esporte tem muito mais de união e respeito do que violência: “Rugby é sobre comunidade, sobre trabalho em equipe, sobre camaradagem. A pancadaria que acontece no profissional é apenas o topo da pirâmide, o ápice do esporte, onde resultado é a única coisa que importa, e cada centímetro conta”. 

Ao responder à pergunta sobre o melhor país, entre Brasil e Austrália, para profissionais do Rugby viverem, Rodrigo não tem dúvidas: “Austrália, com certeza. Essas pessoas aqui irão vivenciar o que realmente é necessário para jogar e viver o Rugby em alto nível, se possivel angariando experiência para levar de volta ao Brasil e lá plantar um bom exemplo de profissionalismo dentro e fora dos campos”. 

Byanca não joga profissionalmente na Austrália, mas afirma: “Na minha vivência como amadora aqui, tenho uma boa perspectiva, já que consigo mesclar uma boa qualidade de vida e uma excelente infraestrutura para a prática do esporte, que era uma grande dificuldade mesmo em nível profissional no Brasil”. 

Rugby feminino

Sobre o Rugby praticado por mulheres, Byanca explica que há um movimento ganhando forças nos últimos anos, com a representatividade feminina vem alavancando consideravelmente o número de mulheres e meninas na prática esportiva. 

“Projetos de inclusão feminina são de extrema importância nesse processo . No Brasil andamos em passos pequenos se compararmos com a Austrália, que possui uma extraordinária quantidade de mulheres no Rugby e uma sólida categoria de base. Mas se comparado com o resto da América Latina e central, o Brasil tem uma excelente projeção”, diz Byanca. 

Rodrigo fala sobre o quanto o deixa feliz ver que as mulheres tem ocupado cada vez mais espaço no Rugby: “Eu sou um grande fã e apoiador do esporte feminino em qualquer modalidade. É incrível ver o quanto o Rugby feminino, nas duas modalidades, cresce e se desenvolve como uma opção viável de carreira para jovens meninas, pois é disso que deveria se tratar o esporte, de deixar um legado e um ambiente ainda melhor para quem está chegando, para a próxima geração. Eu participei disso. E ver esse trabalho sendo desempenhado com meninas que em gerações passadas ouviriam coisas absurdas sobre o esporte feminino é simplesmente incrível.”. 

Benefícios do Rugby

Ao falar dos benefícios que o Rugby trouxe para sua vida, Rodrigo conta: “De todas as boas memórias, o que mais me emociona são as pessoas que conheci na minha trajetória. Eu conheci cariocas, europeus, tonganeses, catarinenses, chineses, japoneses, fijianos, árabes, indianos, baianos, tanta gente boa. No campo e no copo, somos todos iguais. Eu sinto falta dessa camaradagem e desse contato com tanta diversidade”. 

Já Byanca destaca como benefício mais recente a solicitação de um visto (ainda em análise) de talento distinto na Austrália, graças ao Rugby: “Por possuir um excelente histórico no esporte, eu e minha esposa conseguimos aplicar para o visto de talento. Outro benefício relevante sem dúvida foi conhecer muitos lugares ao redor do mundo”. 

Ela também cita momentos inesquecíveis em sua vida graças ao esporte: “acho que um dos mais marcantes, foi quando me tornei campeã brasileira em 2021 e quando estava no jogo abertura da Copa do Mundo. Já tinha participado de algumas competições internacionais antes disso, e eu nem estava escalada para aquele jogo, estava machucada e entrei junto aos staffs. Mesmo assim foi surreal, a energia e o momento foram realmente marcantes”. 

Byanca, à direita, e Franciny, na Copa do Mundo de Rugby de 2022 no Reino Unido.

Já Rodrigo parafraseia o cantor e compositor Roberto Carlos, dizendo: “são tantas emoções!”. Ele descreve um momento especial: “Eu vou sempre vou lembrar com muito orgulho do jogo Brasil vs Peru em Campbeltown, em 24 de fevereiro de 2020, quando eu tive a honra de capitanear os Braussies no que foi uma vitória histórica”. 

Apoio ao esporte

Ao falar do apoio da Tagarela à Brasil Rugby League há cinco anos, Byanca diz o seguinte: “Apenas boas intenções e força de vontade não são suficientes quando estamos falando de projetos grandes como tornar um esporte popular. Precisamos de pessoas e empresas que estejam dispostas a apoiar e investir para que os projetos consigam de fato sair do papel”. 

E Rodrigo completa: “A Tagarela foi, e de certo modo ainda é, uma parceira incrível na nossa vida aqui na Austrália. Eu sempre me surpreendo positivamente, em como a Nina (diretora da Tagarela) e a equipe estão sempre se reinventando e se desenvolvendo para acompanhar as constantes mudanças da imigração aqui na Austrália, sempre mantendo seus clientes e seguidores bem informados. Como cliente Tagarela, eu sempre digo a outras pessoas que eu nunca tive e nunca quis ter outra agência cuidando da minha vida. Desde o começo da nossa história tudo foi feito com tanto carinho, profissionalismo e cuidado, que eu simplesmente nunca vi a necessidade de procurar outras alternativas.

Dessa maneira, eu acredito que um atleta buscando oportunidades na Austrália teria um suporte inigualável da Tagarela nessa grande aventura que é o intercâmbio na terra dos cangurus”.  

Fotos: Acervo Pessoal 

Sobre o autor

Mariana Gotardo

Mariana Gotardo é jornalista com experiência de mais de 20 anos em TV no Brasil. Já foi repórter, apresentadora e editora. Desde 2015 mora na Austrália e produz conteúdo sobre intercâmbio em texto e vídeo.

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